Entre os fatores que marcam a fragmentação, estão o recuo em investimentos além da fronteira e o esvaziamento de organizações internacionais.
O mundo está em fragmentação e uma nova globalização está redefinindo as relações econômicas e comerciais, gerando oportunidades e desafios significativos para nações como o Brasil. O assunto foi tema da edição de maio da Aula ao Vivo FIA Online, que trouxe como convidado o jornalista e escritor, Jamil Chade.
Em um encontro exclusivo com alunos e convidados, Chade, que atua como correspondente na Europa há duas décadas e já contribuiu com veículos como BBC, CNN, France24, Al Jazeera, El País e The Guardian, relatou o que considera os primeiros sinais de um mundo pós ocidental.
Continue a leitura e confira alguns dos principais insights dessa aula.
Em sua apresentação, Chade recuperou marcos históricos, como a queda do muro de Berlim, em 1989, para lembrar que o fim de uma ordem internacional e a disputa de poder a que se seguiu. “Trinta anos depois, a democracia está sob um ataque feroz. Há um número impressionante de conflitos acontecendo de forma simultânea no mundo. A guerra voltou ao continente europeu, a pandemia escancarou desigualdades, há um retrocesso no multilateralismo e há um avanço na intolerância e no ódio”, observou.
Com escritório em Genebra, o jornalista compartilhou informações e acontecimentos que revelam um esvaziamento de organizações como ONU e OMC, antes consideradas o epicentro da globalização, responsáveis pela tomada de decisões que impactavam o mundo todo. “O que está por trás de tudo isso é uma profunda divisão do destino do mundo. O que existe hoje é uma redefinição de poder e de hegemonia. Pela primeira vez desde 1989, temos uma fratura real na globalização e a geopolítica volta a determinar aonde vai o capital”, afirmou.
Ao longo das últimas três décadas, o mundo viveu uma redução gradual nos investimentos externos diretos. Nesse cenário, houve a reconfiguração da produção internacional, baseada em quatro princípios:
Os Estados Unidos cortaram 40% dos investimentos no mercado chinês de 2020 para 2021 e mais 18% nos dois anos seguintes. A Europa realizou o mesmo movimento em relação à China, que, por sua vez, também reduziu aplicação de capital na Europa e nos EUA. Mas esse é apenas um dos aspectos que evidenciam a fragmentação do mundo contemporâneo. Chade destaca também a transformação do uso do dólar em “arma de guerra”, por meio das sanções internacionais adotadas pelo governo norte-americano.
“O mundo não ficou parado diante dessa situação. O que aconteceu foi a busca por alternativas, uma delas por parte dos BRICS que buscaram uma nova forma de criar um sistema paralelo. Faz sentido econômico? Certamente, não. Mas faz sentido em termos de blindagem geopolítica de um bloco. Ninguém sabe quem pode ser o inimigo de amanhã do dólar”, pontuou.
No comércio, a paralisação da OMC, a partir do esvaziamento do seu tribunal máximo, permitiu que países passassem a adotar políticas que violam os tratados internacionais. Na análise de Chade, há um esgotamento deliberado das organizações internacionais.
“A OMC está paralisada, o Conselho de Segurança da ONU em uma agonia profunda. Outro órgão chamado Conferência de Desarmamento, que tem como meta desarmar o mundo, não obtém um acordo sobre sua agenda de trabalho desde 2002. Nessa semana, fracassou um acordo entre os países sobre como lidar com a próxima pandemia – e ela virá. (...) E, para completar, os tribunais internacionais, todos com sede em Haia, tomam decisões que são solenemente ignoradas.”
Paralelamente, crescem os gastos militares no mundo. Em 2023, os investimentos em armas atingiram o recorde de quase 2,5 trilhões de dólares. Ao mesmo tempo, identifica-se um distanciamento entre países ricos e emergentes e aqueles mais pobres. Em 2004, 44% dos investimentos estavam direcionados a países em desenvolvimento. Já em 2022, esse mesmo percentual passou a 33%.
Para o jornalista, a fragmentação da ordem mundial é um obstáculo para os países em desenvolvimento, mas também pode ser uma oportunidade, especificamente, para o Brasil, Turquia, África do Sul, China, Índia e alguns emergentes. São nações que podem se tornar eventuais hubs na ruptura das cadeias de produção, com investimentos de maior valor agregado.
Chade identifica uma “cegueira” das potências ocidentais diante da demanda de países marginalizados e da evolução do mundo. “Essa redefinição do mundo acontece, justamente, quando a gente mais precisa de uma liderança global. Nenhum desafio do século 21 será resolvido dentro de fronteiras nacionais - nem a próxima pandemia, a corrupção internacional, o terrorismo, a regulação das redes, a inteligência artificial ou a mudança climática”, enfatiza.
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